Páginas

Quem


Gosto de pensar que minha vida pode ser definida em 4 parágrafos e um acréscimo:

Minha infância foi cercada dos melhores exemplos, dentro e fora da família, porém, com pequenas doses de incompreensão por comportamento agitado e curiosidades perigosas. Desde criança meu temperamento exaltado conturbou os meus relacionamentos e me inclinou à rebeldia. Pequenos acidentes propositais ou não, sumiço de coisas alheias e destruição de objetos pequenas e grandes que eu manipulava, são alguns exemplos de acontecimentos que marcaram minha infância na convivência com a família e a vizinhança. E nunca tive regalias, filho de família pobre, porém de honra rica.

A adolescência começa com o grande sentimento de ser um incompreendido, percepção que direcionou minha decisão pelo rock pesado, skate e noitadas sem controle de horário, é o que eu penso, mas sei que há controvérsias, eu queria na verdade, estar sempre longe de casa. Este comportamento não impediu meu desejo de aprender, tanto no estudo como no trabalho, com treze anos e meio eu já estava no ensino médio e no meu primeiro trabalho em uma grande empresa. Um curioso nato e apaixonado pelo conhecimento, no entanto, comecei, também por curiosidade, a fumar, beber e outras coisas mais, o que ocasionou grandes distúrbios de personalidade e de relacionamento. Foi também o tempo de entrar na Universidade que abandonei após dois anos e meio.

Ao atingir a maioridade lutei muito para reconstruir minha vida, tendo a família como o maior apoio, pois, os amigos, haviam se afastado por justa causa e a solidão era torturante, ou melhor, uma amiga fiel. Após ter obtido sucesso na recuperação, passei dificuldades de relacionamento afetivo e durante um ano inteiro, planejei dedicar minha vida ao próximo, para recuperar minha dignidade e autoestima , colaborando na recuperação do outro. Escolhi uma Instituição que atendia moradores de rua, onde permaneci por nove belos anos.

Acréscimo: Neste período, eu que era cabeludo, raspei a cabeça, troquei vaidade por roupa de saco, passei à vida contemplativa e de caridade. Dormi no chão, na rua e caminhei longas distâncias como um peregrino pregador, sonhador de ideais tão distantes da realidade quanto a razão está do coração – ainda mais este meu bobo coração – fui ao encontro de pessoas que nem conhecia e em outros tempos até medo eu tinha, cuidei das feridas alheias até esquecer das minhas, conversei com sábios das calçadas e morei com mendigos, viajei por quase todos os estados brasileiros, que eu me lembre faltou apenas três. Nestas viagens conheci dezenas, centenas, milhares de pessoas – ordem crescente que também significa a proximidade e relevância de quem conheci – definitivamente entreguei tudo que tinha até não ter mais nada, por isso perdi o rumo do caminho e decidi voltar, em certo sentido, para recuperar o que havia dado, um verdadeiro paradoxo que não é simples de ser explicado.

Hoje, após tomar a mais difícil decisão da minha vida, ou seja, voltar para vida comum depois da dedicação humana, social e espiritual citada acima, voltei também à Universidade e ao trabalho modesto de uma agência de propaganda como redator publicitário, que aliás, considero um sonho realizado, em um lugar que me ensina e me alegra a cada dia. Enfrento desafios pessoais bastante delicados como qualquer pessoa, mas decidido a seguir em frente, restituindo minha vida alquebrada e aproveitando todas as oportunidades para realizar os novos projetos que tracei para o tempo presente e futuro, com o olhar sutil ao passado inesquecível, o educador que tanto me ensinou a ser gente; a ser mais humano. Minha vida é controversa e sobre ela você também pode comentar – sempre há controvérsias.